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sexta-feira, 19 de agosto de 2011

ANÁLISE SOBRE O ARTIGO 307 DO ANTEPROJETO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Sob o fundamento de dar mais celeridade ao Poder Judiciário, o Senado Federal encarregou uma Comissão de Juristas, presidida pelo Ministro Luiz Fux, a elaboração do Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil.
Com a apresentação do anteprojeto ao Senado Federal, deu-se início ao Processo Legislativo através do Projeto de Lei do Senado nº. 166/2010 e Projeto de Lei na Câmara 8046/2010, ficando a cargo do Congresso Nacional a análise e votação para ao final ser apreciado pelo Poder Executivo.
Posto isto, o presente trabalho tem a proposta de analisar o artigo 307 do Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil que, ao contrário do projeto inicial[1], inaugura o Capítulo III – DA IMPROCEDÊNCIA LIMINAR DO PEDIDO. Senão vejamos:
“CAPÍTULO III
DA IMPROCEDÊNCIA LIMINAR DO PEDIDO
Art. 307. O juiz julgará liminarmente improcedente o pedido que se fundamente em matéria exclusivamente de direito, independentemente da citação do réu, se este:
I - contrariar súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça;
II - contrariar acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
III - contrariar entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência.
§ 1º O juiz também poderá julgar liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde logo, a ocorrência a decadência ou a prescrição.
§ 2º Não interposta a apelação, o réu será intimado do trânsito em julgado da sentença.
§ 3º Aplica-se a este artigo, no que couber, o disposto no art. 306”.
Como de costume, quando há a troca de diplomas legais, não podemos deixar de comparar o futuro Código de Processo Civil com o de 1973[2], que vigora até o presente momento. Analisando o texto legal, verifica-se que o dispositivo supra descrito corresponde ao artigo 285-A do Código de Processo Civil de 1973, introduzido ao texto pela Lei Federal nº. 11.277/06, vejamos:
“Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.
§ 1º Se o autor apelar, é facultado ao juiz decidir, no prazo de 5 (cinco) dias, não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação.
§ 2º Caso seja mantida a sentença, será ordenada a citação do réu para responder ao recurso”.
Tal reforma no diploma de processo recebeu duras críticas pela doutrina, sendo, inclusive, levantada a bandeira de sua inconstitucionalidade, pois feriria o princípio do contraditório, da isonomia, dentre outros.
Vale frisar que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade da Lei nº. 11.277/06 nº. 3695, alegando que a referida lei estaria maculando o artigo 5º, caput e incisos XXXV, LIV e LV da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Apesar do posicionamento da Ordem dos Advogados do Brasil, alguns doutrinadores defendem que o artigo 285-A do CPC não mostra-se inconstitucional, como demonstra DIDIER JR, Fredie[3], sustentando que trata-se de um julgamento pela improcedência, diferente do indeferimento, sendo o réu vitorioso, não havendo prejuízo para ele.
Além disso, o professor Didier alega que o artigo dispõe expressamente que a matéria deve ser unicamente de direito, como ocorre no julgamento antecipado da lide, artigo 330 do Código de Processo Civil de 1973, antecipando-se ainda mais o julgamento da demanda.
Por fim, o julgamento seria apenas para as causas repetitivas, ou seja, causas que versem sobre a mesma questão jurídica, discutindo-se a mesma tese jurídica.
O artigo 307 do Anteprojeto vai além do previsto no artigo 285-A do Código de Processo Civil de 1973, isso porque a improcedência liminar da demanda se fundamenta quando a matéria for exclusivamente de direito e desde que contrarie entendimento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, sumulado ou não, e trazendo a tona o regime de julgamento de casos repetitivos.
Verifica-se que o Projeto do Novo Código de Processo Civil visa não só estabilizar a jurisprudência dentre os tribunais superiores, como, também, uniformizar até mesmo no primeiro grau de jurisdição, conforme o disposto no inciso III do artigo 307, onde o juiz está autorizado a julgar liminarmente o pedido quando “contrariar entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência”.
Assim, o Anteprojeto ampliou o disposto no artigo 285-A do Código de Processo Civil, visando dar mais celeridade aos processos através da valorização da jurisprudência.
Para melhor elucidar, faz-se necessário analisar o disposto no artigo 930 do Projeto, que elenca a possibilidade do incidente de resolução de demandas repetitivas, vejamos:
“CAPÍTULO VII
DO INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS
Art. 930. É admissível o incidente de demandas repetitivas sempre que identificada controvérsia com potencial de gerar relevante multiplicação de processos fundados em idêntica questão de direito e de causar grave insegurança jurídica, decorrente do risco de coexistência de decisões conflitantes.
§ 1º O pedido de instauração do incidente será dirigido ao Presidente do Tribunal:
I - pelo juiz ou relator, por ofício;
II - pelas partes, pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, por petição.
§ 2º O ofício ou a petição a que se refere o § 1º será instruído com os documentos necessários à demonstração da necessidade de instauração do incidente.
§ 3º Se não for o requerente, o Ministério Público intervirá obrigatoriamente no incidente e poderá assumir sua titularidade em caso de desistência ou de abandono”.
Nota-se que a finalidade do incidente é criar uma decisão paradigma, ou seja, com força de jurisprudência, devendo a tese ser aplicada a todos os processos que versem sobre a questão de direito ali debatida e que tramitem na jurisdição do respectivo tribunal julgador.
Todavia, fica o seguinte pensamento: Realizado o incidente, a decisão proferida terá força de jurisprudência, devendo todos os casos daquela jurisdição receber o mesmo julgamento. Contudo, o direito não é uma ciência exata, onde de tempos em tempos o entendimento sobre determinada legislação ou matéria está em constante mudança.
Desta forma, como seria possível modificar o entendimento já confirmado pelo incidente sobre determinada matéria exclusivamente de direito já firmado através do incidente, se o Novo Código de Processo Civil prevê que o magistrado pode julgar liminarmente improcedente o pedido.
Assim, verifica-se que apesar da Comissão de Juristas visar a celeridade das demandas através da valorização da jurisprudência, na verdade o resultado obtido é o engessamento das decisões.
CONCLUSÃO
Por todo o exposto, pode-se afirmar que o Projeto do Novo Código de Processo Civil foi instituído única e exclusivamente para desafogar o Poder Judiciário, através da valorização das súmulas e jurisprudências.
Não podemos deixar de ressaltar que a celeridade idealizada pelo Anteprojeto traz benefícios para o ordenamento jurídico, no entanto, as novidades elencadas no mesmo vão de encontro com a cultura jurídica nacional o que produzirá grande aversão e questionamentos quanto aos dispositivos previstos no Novo Código.
No tocante ao artigo 307 do Novo código, fica evidente que a sua principal atuação será combater as chamadas demandas repetitivas.
A primeira vista, tal dispositivo ameaça engessar as decisões, evitando a inovação jurídica e o livre exercício do debate, pois uma vez proferida decisão sobre o incidente de demandas repetitivas, tal matéria dificilmente poderá ser revista, impossibilitando a apreciação de novos argumentos, o que poderá colocar por terra os debates e teses jurídicas

Fonte: www.jurisway.org.br, (Autor: Wellington Da Silva De Paula)

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